Se por um lado, a redução da taxa de fecundidade fez cair a razão de dependência demográfica (calculada pelo número de pessoas ativas que sustentam inativas), beneficiando o desenvolvimento da economia global, por outro, exigiu dos países altos investimentos para suprir as necessidades de proteção da população cada vez mais longeva. A diferença é que os países mais desenvolvidos aproveitaram a janela do bônus demográfico – período que a população economicamente ativa é maior que a inativa – para enriquecer. O Brasil, entretanto, pode perder a chance de ficar rico se não aproveitar essa janela, que deve se fechar em no máximo 15 anos, para desenvolver sua economia.
Caso o envelhecimento da população brasileira ocorra em ritmo mais veloz do que o previsto e a economia não se desenvolva no patamar esperado, a ponto de reduzir a pobreza, aumentar o nível de emprego e a qualidade de vida, então, na visão do demógrafo José Eustáquio Alves, o futuro do país será nebuloso. Mas, mesmo diante do fraco crescimento econômico atual e da falta de perspectivas de mudanças no curto prazo, ele prefere manter uma visão mais otimista, acreditando que o país conseguirá vencer os obstáculos e prover proteção para a população de idosos no futuro.
Foi esta visão que José Eustáquio Alves apresentou em sua palestra “Mesa Redonda Economia e Seguro: os Desafios da Demografia”, realizada pela Escola Nacional de Seguros (Funenseg), dia 2 de junho, no Hotel Maksoud Plaza, em São Paulo (SP), com a participação dos economistas Claudio Roberto Contador e Lauro Faria. Prestigiando o evento, o presidente do CVG-SP, Dilmo Bantim Moreira, interagiu com os especialistas, apresentando questões relacionadas ao ramo de pessoas.
Mudanças demográficas no mundo
Um estudo divulgado pela revista The Economist anos atrás previa que até 2014 a economia do Brasil ultrapassaria a da Inglaterra e da França; até 2020, seria maior que a da Alemanha; e em 2030 que a do Japão. Por fim, o estudo apontava o Brasil como a quarta economia do mundo até 2050, atrás apenas da China, Índia e Estados Unidos. Para chegar a esse resultado, segundo José Eustáquio, o estudo considerava a questão demográfica e o crescimento anual da economia brasileira na média de 4% a 5% ao ano.
“Como na época todas as economias emergentes estavam crescendo acima das economias avançadas, previa-se um processo de redução das desigualdades, mais conhecido como grande convergência”, explica. Entretanto essas previsões não se concretizaram. O Brasil não cresceu nesse patamar e tampouco a economia global. “Teoricamente, crescer 4% ao ano não é impossível”, pondera o especialista.
Mas, além de a economia global não atingir o desempenho esperado, um fator vem agravando a situação. Trata-se da elevação da razão de dependência demográfica, que representa a dependência da população mais velha em relação à população em idade ativa (PIA). Segundo José Eustáquio, por enquanto, a carga de dependência demográfica ainda é maior nos países do G-7 do que nos países emergentes que integram o grupo do E-7, do qual o Brasil participa.
Previsões alarmistas indicam que os países do G-20, que representam 80% da economia global, devem parar de crescer em virtude da maior razão de dependência, resultado do envelhecimento da população. A previsão é que a PIA atinja seu pico até 2020 e daí por diante despenque até 2040, estabilizando-se em seguida. Segundo José Eustáquio, este período futuro reserva grandes mudanças demográficas.
Crescimento demográfico no Brasil
Sobre o Brasil, José Eustáquio adiantou algumas projeções do IBGE que serão divulgadas apenas em agosto. A população brasileira, que cresceu 50 vezes em 200 anos, passando de 3,4 milhões de pessoas para 170 milhões, atingirá 200 milhões até 2014. Já a projeção da ONU é que o país alcance esse patamar ainda em 2013. Nas próximas décadas, porém, a população não deverá crescer muito, segundo a ONU, devendo atingir 220 milhões. A maior queda começará a partir de 2100, quando chegará a 195 milhões de pessoas.
José Eustáquio explica que essa redução tem a ver com a transição urbana, que hoje no país corresponde a 85% do total de habitantes. “Nas cidades, o nível de educação é maior e também os custos com transportes e alimentação, o que tem efeito sobre a dinâmica das famílias e a fecundidade”, explica. Na projeção de esperança de vida, a ONU indica que em 2100 as mulheres viverão em média até 90 anos e os homens até 85 anos. Avaliando essa projeção na linha do tempo, José Eustáquio observa que entre 1950 e 2010 houve um ganho grande no país também em qualidade de vida.
Do combate à fome de décadas atrás, hoje, o Brasil se vê diante de outros indicadores que revelam a melhoria de vida. Caso do indicador antropométrico, segundo o qual, atualmente, 50% da população masculina e 48% da feminina têm excesso de peso. Além disso, 12% dos homens são obesos e 16% das mulheres também. “Se morre muito mais hoje no Brasil de obesidade do que de fome”, diz. Aliás, sobre as mortes por causas externas, ele apresentou um dado alarmante: 115 mil pessoas morrem por ano no país em acidentes de transito ou homicídios. “O número corresponde ao dobro de mortes de soldados americanos na Guerra do Vietnã em 15 anos. Isso explica porque existem mais mulheres que homens”, observa.
Bônus demográfico
A taxa de fecundidade, que até a década de 40 era de 6 filhos em média por mulher, caiu até chegar aos 1,9 filho, atualmente. José Eustáquio explica que essa taxa não resulta em crescimento da população, porque dois filhos repõem apenas os pais. “Se continuar nesse patamar a população estabiliza, mas se baixar a população diminui”, analisa. Porém, estudos revelam que a tendência é de queda. No estudo do Ipea, por exemplo, que relaciona a Taxa de Fecundidade Total (TFT) com o crescimento do PIB, verifica-se que o pico (14%) foi atingido na década de 70, época do “Milagre Econômico Brasileiro”. Em seguida, caiu no período de recessão e, posteriormente, se recuperou na fase do Plano Real.
Atualmente, a razão de dependência está abaixo de 50, o que significa, segundo o demógrafo, que cada pessoa em idade de trabalhar sustenta 0,5 pessoa dependente. “Se a dependência diminui, as pessoas têm mais recursos para investir em si própria e na família”, afirma. Mas ele avalia que esse bônus demográfico não pode ser sacado automaticamente. Para ser real, deve vir acompanhando de investimentos em educação, saúde e geração de emprego. “O que adianta ter muita gente em idade de trabalhar se não tiver emprego, ou muita gente trabalhando sem produtividade?”.
Para José Eustáquio, agora é o momento de o país aproveitar o bônus demográfico, porque no futuro a carga de dependência demográfica aumentará. “O bônus só acontece uma vez e nunca mais”, adverte. Ele também alertou sobre o “Tsunami grisalho”, representado em gráfico em que a linha do aumento da população mais velha cresce no formato de uma onda. Em 2014 haverá mais pessoas de 60 anos do que de 14 anos. Em 2010, havia 2 milhões de pessoas com 60 anos ou mais no Brasil; em 2050 serão 70 milhões. Em 2060, haverá 10 milhões de pessoas no Brasil com 85 anos ou mais.
“O envelhecimento populacional não depende da longevidade, mas da fecundidade, que reduz a base da pirâmide e aumenta a proporção dos mais velhos no topo”, observa. De acordo com projeções da ONU, se a taxa de fecundidade cair ainda mais rápido no Brasil, em 2050 metade da população brasileira estará acima de 60 anos; 45% acima de 65 anos e um quarto com mais de 80 anos. Mas se a taxa de fecundidade se mantiver na média, a idade mediana da população será de 50 anos. “Em 1965, a idade mediana era de 18 anos”, diz.
Para José Eustáquio, o envelhecimento da população é inevitável. O que não se sabe é se o envelhecimento será lento ou rápido. “O Brasil vive seu melhor momento demográfico, com a menor razão de dependência demográfica. Temos mais 10 ou 15 anos para aproveitar essa janela de oportunidade”, diz. Mas, para acabar com a pobreza e o desemprego, a economia precisaria crescer 4%, segundo ele. “A tendência é que a economia brasileira e mundial diminua o ritmo de crescimento. Mas o envelhecimento não deve parar”, afirma.
Chance para o ramo de pessoas
Questionado pela plateia, o economista Lauro Vieira afirmou que o bônus demográfico para o seguro de pessoas representa “o melhor dos mundos”, porque essa fase em que a população em idade ativa é maior é ideal para o ramo. Cláudio Contador comentou que os países nórdicos acabaram com a previdência social em virtude do envelhecimento da população. “É um desafio enorme para previdência e para o seguro também. É muito bonito ver idosos, mas temos de pensar na vida com qualidade dessas pessoas”, diz.
O presidente do CVG-SP, Dilmo Bantim Moreira, ponderou que se a população viver mais, a qualidade de vida também aumentará e o governo não terá como sustentar a previdência e a saúde. “Se juntar tudo isso, podemos pensar que no futuro o seguro e a previdência se fundirão num único elemento, que deverá ser adquirido individualmente. Então, no futuro não teremos seguro vida e nem de previdência, mas algo mais parecido com o Universal Life?”. Cláudio Contador confirmou essa hipótese e acrescentou que o ideal seria que o país permitisse transformar plano de previdência em plano de saúde.
Fonte: Segs
Foto: www.portalodm.com.br
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